Bacellar é preso por ajudar TH Joias a fugir da Justiça com freezer, caminhão e celular

Na manhã de 3 de setembro de 2025, enquanto a Polícia Federal cercava a casa de Thiego Raimundo dos Santos Silva, o ex-deputado conhecido como TH Joias, um caminhão-baú saía carregado de caixas da residência dele — e dentro delas, segundo registros de câmeras de segurança, havia um freezer cheio de picanhas. A cena parecia absurda. Mas era parte de um plano detalhado para sabotar uma operação de combate ao crime organizado. O responsável por alertar TH Joias? O presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), Rodrigo Bacellar. Três meses depois, em 3 de dezembro de 2025, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, decretou sua prisão preventiva. A justificativa? Obstrução da justiça em escala inédita.

"Deixa, doido": a frase que virou prova contra um presidente da Alerj

As mensagens recuperadas pela Polícia Federal revelam um diálogo frio, quase cômico, mas profundamente criminoso. Na manhã da operação, TH Joias, já em pânico, mandou uma pergunta direta: "E o freezer? E as carnes?". Bacellar respondeu: "deixa, doido". Não era só uma gíria. Era uma ordem. O freezer, cheio de cortes nobres, era mais que alimento — era símbolo de status, de dinheiro lavado, de uma vida que ele não queria perder. E Bacellar, em posição de poder, garantiu que não perderia. A frase foi gravada, salva, e agora é peça-chave do processo. O que parecia piada de botequim virou evidência de corrupção institucional.

A logística da fuga: caminhão, celular e um assessor no olho do furacão

As câmeras de segurança do condomínio onde TH Joias morava registraram o caminhão-baú estacionado às 4h da manhã, horas antes da chegada dos policiais. Dois homens carregaram caixas, algumas delas com o nome de supermercados de luxo. Não eram móveis. Era o que restava da fortuna dele — e do que ele tentava esconder. Mas o mais surpreendente foi o celular. Logo após o alerta de Bacellar, TH Joias apagou o aparelho, comprou um novo, e passou a usar apenas ele. Em uma mensagem enviada às 6h03, ele mandou uma foto da tela da câmera de segurança, mostrando os agentes dentro da casa. E, em seguida, enviou o contato da sua advogada. Era um sinal: ele não estava fugindo sozinho. Estava sendo guiado.

Por trás da cena, o assessor direto de Bacellar, Thárcio Nascimento Salgado, foi acionado para organizar o esconderijo. Hoje, ele usa tornozeleira eletrônica. A operação, batizada de "Unha e Carne" — uma referência tanto ao freezer quanto à logística suja — mostrou que a obstrução da justiça não foi um ato isolado. Foi um esquema. Com recursos, pessoas e hierarquia.

Do crime organizado ao legislativo: a trajetória de TH Joias

TH Joias não era um político comum. Ele já havia sido preso em 2017 pela Delegacia de Combate às Drogas (DCOD), acusado de ser um dos principais articuladores do tráfico de drogas e armas no Rio, com ligações diretas ao Comando Vermelho, ao Terceiro Comando Puro e à Amigos dos Amigos. Lavava dinheiro, controlava contas de facções, e usava a política como capa. Entrou na Alerj pelo MDB, partido que o expulsou em setembro de 2025, após sua prisão. A Operação Zargun, deflagrada em conjunto pelo Ministério Público Federal e pelo Ministério Público do Rio de Janeiro, o acusa de intermediar compras de fuzis, equipamentos antidrones e toneladas de cocaína. Mas o que torna esse caso único é a conexão com o poder legislativo.

Um patrimônio que cresceu 832% — e R$ 90 mil apreendidos no carro

Enquanto TH Joias se escondia, Bacellar crescia. Segundo a Polícia Federal, seu patrimônio em aplicações financeiras saltou de R$ 85 mil em 2018 para R$ 793 mil em 2022. Um aumento de 832% em quatro anos. Sem declaração clara de fontes. O Ministério Público do Rio investiga enriquecimento ilícito. E não é só isso. Na véspera da prisão de TH Joias, policiais apreenderam R$ 90 mil em dinheiro dentro do carro que ele usava para prestar depoimento. Dinheiro vivo. Sem nota fiscal. Sem explicação. O que era? Pagamento? Propina? Recompensa por ajudar a fugir?

Quem assume a Alerj? E o que vem a seguir?

Quem assume a Alerj? E o que vem a seguir?

Com Bacellar preso, o primeiro vice-presidente da Alerj, Guilherme Delaroli (PL), assumiu interinamente a presidência. Delaroli é considerado braço direito de Bacellar — e agora está sob escrutínio. Na sexta-feira, 5 de dezembro de 2025, a Comissão de Constituição e Justiça da Alerj realizou uma sessão secreta para analisar o caso. O parecer será votado em plenário. Se aprovado, Bacellar pode perder o mandato e ser afastado permanentemente. Mas o que está em jogo vai além de um político. É a credibilidade da própria Assembleia. Se um presidente pode ajudar um traficante a fugir, o que mais está escondido?

O que isso muda para o Rio de Janeiro?

A operação "Unha e Carne" não é só sobre um freezer. É sobre o colapso da fronteira entre crime organizado e poder público. O Rio já viu políticos envolvidos com milícias, mas nunca um presidente da Alerj orientando um criminoso a esvaziar sua casa para evitar provas — e se preocupando com o estoque de picanha. Isso mostra que o crime organizado não precisa mais de pistolas. Precisa de assessorias, contas bancárias e cargos eletivos. E quando o poder legislativo se torna refém dessas redes, a democracia perde o chão. O povo não quer só justiça. Quer transparência. E não há transparência onde há freezer cheio de carne e mensagens que dizem "deixa, doido".

Frequently Asked Questions

Como Bacellar conseguiu acessar informações sigilosas da Operação Zargun?

A Polícia Federal acredita que Bacellar usou sua posição na Alerj para acessar canais de comunicação entre órgãos de segurança e o Ministério Público. Ele teria contatos dentro da PF e do MPF que o mantinham informado sobre prazos, locais e estratégias da operação. As mensagens interceptadas mostram que ele sabia da data exata da prisão antes mesmo dos agentes entrarem em ação.

Por que o freezer de carne foi tão importante na investigação?

O freezer não era só um eletrodoméstico. Era um símbolo de dinheiro ilícito. Carne nobre, especialmente picanha, é um bem de alto valor e fácil de esconder ou vender no mercado paralelo. A preocupação de TH Joias com o estoque — e a resposta de Bacellar — mostram que eles tratavam bens criminosos como patrimônio legítimo. Isso reforça a tese de lavagem de dinheiro por meio de consumo ostentatório.

O que acontece com o mandato de Bacellar agora?

A prisão preventiva não suspende automaticamente o mandato. Mas, se a Alerj aprovar o parecer da CCJ que aponta crime de responsabilidade, ele poderá ser afastado por votação em plenário. Se condenado criminalmente, perderá o mandato por lei. O processo político pode levar semanas, mas a pressão da opinião pública já é enorme.

Quem mais pode ser implicado nesse caso?

Além de Thárcio Nascimento Salgado, já com tornozeleira, a PF investiga outros assessores de Bacellar e possíveis intermediários no MDB. Também há suspeitas de que funcionários da Alerj tenham ajudado a esconder documentos ou facilitado acesso a sistemas internos. A operação ainda está em andamento, e novos nomes podem surgir.

O que a prisão de Bacellar significa para a política carioca?

É um sinal de que o poder legislativo não está imune à corrupção. O Rio já viu prefeitos e deputados federais envolvidos, mas um presidente da Alerj envolvido diretamente em uma fuga de traficante é inédito. Isso abala a confiança na instituição e pode acelerar reformas de transparência, como a obrigatoriedade de declaração de patrimônio por parlamentares.

Há precedentes de políticos ajudando criminosos a fugir no Brasil?

Sim, mas raramente com tanta clareza e evidência digital. Em 2021, um vereador de São Paulo foi preso por avisar um traficante sobre uma operação. Mas nesse caso, o nível de detalhe — mensagens, imagens, patrimônio suspeito e envolvimento direto de um presidente de casa legislativa — é sem precedentes. O caso pode se tornar referência nacional para combate à corrupção política.

© 2025. Todos os direitos reservados.